quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

Do Ghetto ao Coliseu

Nos anos 70, nos Estados Unidos, e no princípio dos anos 90, em Portugal, o rap foi sempre uma música do ghetto, ligado aos pobres, imigrantes, etc. Estava restrito a esses lugares e foram pessoas de lá que criaram as raízes, pelo menos nesses dois países (e em França também).

Mas agora já não é assim. Nos Estados Unidos o rap cresceu tanto que se tornou das maiores modas alguma vez vistas. Superou o rock e outros géneros, fundiu-se com os mesmos e aderiu ao mainstream. Entretanto expandiu-se para outros países, tomando forma na Alemanha, França, Brasil, etc. Juntamente com ele foi o resto da cultura Hip Hop: breakdance, graffiti, beatbox e a roupa (por muito que queiramos, as calças largas estarão sempre associadas ao Hip Hop). A música e a cultura deixaram de ser desconhecidos do grande público e passaram a fazer parte dos favoritos. Hoje qualquer um abre uma janela e vê putos de calças largas, boné para trás, t-shirts a dar pelos joelhos e camisolas com letras esquisitíssimas. É comum a toda a gente. Quem não viu ainda um boné da marca New York?

O rap (Rhytme and Poetry) começou a passar nas rádios e levou MCs portugueses aos top’s. Pôs betos a abanar as ancas e chavalinhas a dar risinhos em concertos do 50 Cent. Atraiu o dinheiro e consequentemente as editoras, entrou na MTV e fez famoso o gangster rap. Entrou nas FNAC’s e mesmo lojas como a Valentim de Carvalho, que o encaravam com receio, acabaram por admitir ter discos dos Da Weasel nas suas prateleiras. O breakdance conseguiu sobrepor-se (na minha opinião) ao playback e mudou as gerações mais jovens. A fama penetrou no hip hop tão fortemente que já existem centenas de videoclips com limusinas e gajas de biquini.

Agora o rap já NÃO é do ghetto e sim de toda a gente. Ouve-se em todo o lado e são lançados álbuns do género por toda a gente. Pobres ganharam fortuna e apenas os resistentes continuam na sombra ou com um pé em cada lado. Por isso, ninguém me venha dizer que só os que fazem parte de bairros problemáticos é que podem ser MC’s. Toda a gente pode ser MC desde que tenha algo para relatar. A regra de ouro é fala daquilo que viveste. E hoje em dia, não são só as pessoas que vivem no ghetto que têm más experiências. Acreditem, não foi só o Hip Hop que saiu do ghetto nestas últimas décadas.

sábado, 20 de janeiro de 2007

Falsa Moda

Modas... A coisa mais estúpida que alguém alguma vez inventou. Tanto dano causou e voltará a causar, tantas gerações modificou para proveito dos que a criaram, tanto dinheiro foi parar às mãos erradas, tantas massas foram iludidas. Não é irónico como o hip hop, um inimigo desta atitude, tenha sido subitamente chupado de todo o conteúdo e transformado em música de entretenimento para a juventude? Desculpem aqueles que se sentiram atingidos, eu refiro-me a apenas uma área do hip hop, pois sei que ainda há muito e bom que continua por aí a inovar e deixar plateias de boca aberta, entre battles de bairro e concertos no Hard Club. Um enorme obrigado para esses.

Mas acreditem, podíamos estar pior representados a nível nacional e interna­cio­nal. Os Da Weasel e o Boss AC são pessoas que não desgosto, aliás gosto de Boss AC (todos os álbuns, claro que umas músicas mais que outras) e do grupo gosto dos álbuns mais antigos. Isso é uma coisa interessante. Nestes grupos que encontraram a terrível fama e que, por muito que digam que não, se deixaram afectar, os amantes de bom gosto notarão um crescente prazer à medida que voltamos atrás no tempo. Gosto do “RAP – Ritmo, Amor e Palavras” mas mais do “Rimar Contra a Maré” e ainda mais do “Manda Chuva”. Voltando à linha da frente, temos sempre o divino e incensurável Sam The Kid, o senhor Humildade, ainda mais à frente os também divinos Mind Da Gap (apesar de eu pessoalmente achar que no penúltimo disco algumas músicas podiam estar melhores), e vão crescendo outros de outra subárea do hip hop como Expensive Soul (de que gosto) e SP & Wilson (não fazem muito o meu estilo, mas respeito-os). Pensando que não, ao olhar para a histeria da chavalada nos concertos do Boss AC, podíamos estar MUITO PIOR representados. Cada um que imagine com a sua cabeça.

O que não deixa de é de ser uma moda. Uma falsa moda. Se se perguntar a um puto qualquer entre os oito e os doze anos quantos grupos de hip hop conhece, só são dois: Da Weasel e Boss AC. E isto representa uma cultura distorcida sustentada por muuuuitos outros. Não será uma injustiça? Quer dizer, concerteza que o Boss AC faz parte da old school, suportou isto quando era mais difícil e participou em dois temas do Rapública. Mas não foi o único! Não podemos culpar alguém que não fez mais do que trabalhar para receber a fama, mas podemos culpar o sistema que a deu. Sim, porque como disse no tópico anterior, isto das modas não são as crianças e os jovens que as criam, pelo menos agora, mas sim a indústria e a comunicação social (televisão, rádios, editoras,...). Senão porque é que o Boss AC só atingiu o seu auge quando foi incluído na colectânea da telenovela da TVI?

Por isso é que, quando algum amigo meu pouco apaixonado pelo hip hop goza comigo quanto à ironia presente na situação, eu só respondo: “É uma falsa moda.”

sábado, 6 de janeiro de 2007

Geração TV e outros assuntos...

Não criei este tópico porque é a minha faixa preferida da colectânea “Poesia Urbana” (OK, está bem, também gosto da do Valete) mas sim porque veio de um outro assunto em que estive a matutar e que considero ambos importantes. Pois bem, vou começar pelo original (sempre!).

COMECEI A GOSTAR DE MÚSICA TARDE E A MÁS HORAS, achava que nunca seria uma coisa assim tão maravilhosa como faziam querer. Comecei com a música que o meu irmão ouvia, e, pela primeira vez na história de alguém que se deixa guiar pelos outros, foi isso que me salvou.

Não sei quantos de vocês começaram a ouvir hip hop antes de 2003/2004 (antes de entrar na moda) mas se não, arrependam-se! Eu comecei por volta de 2001, talvez... («...2001, tipo houve um ‘bum!’/nessa altura o rap já era um música comum» - Xeg in “Remisturas vol.1”) às vezes os melhores momentos são os mais difíceis de localizar no tempo. Gosto muito de relembrar esse tempo (que na realidade está tão perto, só esta moda horrível é que o torna longuínquo), por isso imagino o que será para os MC’s da old school reviver os seus anos noventa. Não havia hip hop nas telenovelas, aliás (bons tempos) havia menos telenovelas nessa altura, acho eu (desmintam-me se estou errado, mas também concordo que mesmo assim em demasia). Os primeiro sons que ouvi (confissão: eram copiados porque não se vendia hip hop em Braga, só havia Vadeca e pouco mais) foram Entre(tanto), do Sam The Kid, o primeiro do Guardiões de Subsolo, a colectânea “2º Piso” do Cruzfader e dos Terrorismo Sónico, “A Verdade” e o “Sem Cerimónias” dos Mind Da Gap, e o grande Boss AC em “Manda Chuva”, um pouco de Micro mais tarde (lembro-me de ouvir pela primeira vez o “No Topo Do Mundo”), etc. Valete, MatoZoo e outros só mais tarde. Entretanto comecei a escrever as minhas rimas (tão parvas), em que me inspirei particularmente no primeiro álbum do Gabriel, o Pensador. O primeiro álbum que comprei foi aquele que menos gostei (sugestão do meu irmão): “Podes Fugir Mas Não Te Podes Esconder” dos Da Weasel com o tema tão passado “Tás Na Boa” (foi mesmo azar, pois também é o álbum deles que menos gosto). Foi uma compra tardia e só obrigado pela oferta de um checkdisc. De qualquer forma o meu irmão continuou a arranjar cópias de álbuns de hip hop (sempre teve menos escrúpulos no que toca a isso), pois já estávamos apanhados na sua teia (agora apanhados, só se for na Net).

Comprei Kacetado e Dupla Consciência e em breve chegamos a 2004 com o “Conhecimento” de Xeg e outros tantos (esse ano foi um pico em termos de variedade), comprei Bomberjack (Bomba Relógio), um bocado a arriscar as minhas poupanças, mas por causa disso tornei-me um grande admirador dele. Neste processo de crescimento e busca de informação só me lamento de me ter descurado dos estrangeiros, um fracasso de que me tento redimir agora. No entanto fui adquirindo gostos nacionais, mesmo nos mais desconhecidos com Beto (que, por acaso, disse Sam The Kid no dia 21 de Dezembro, em directo da Antena 3, está a preparar um álbum). O facto de não conhecer mais ninguém em Braga que gostasse de hip hop não me causava nenhum transtorno. Até chegar o “Baza Baza” (a crítica fica para o próximo tópico).

A “evolução” do Boss AC fez a indústria abrir os olhos para o potencial do género e libertou a euforia pindérica nas criancinhas que começavam a sustentar um no­vo estilo de vida, uma nova imagem, a Geração TV. Tenho consciência de que são pes­soas da minha idade as mais activistas deste movimento ignorante e com valores dis­­­tor­cidos, o que não faz com que me queira incluir nela. Felizmente devo aos meus pais um agradecimento por me terem educado de modo a nunca ver telenovelas nem ser agarrado à televisão. Quando tinha menos de seis anos, e se calhar mesmo depois, já não sei, via a Rua Sésamo (Popas, Monstro das Bolachas, o qual me fazia fome, etc.) falada por 2caras, e só no final da escola primária surgiu os Power Rangers, Dragon Ball, etc. A explicação para o precipício que se impõe entre mim e os parolos da minha idade que vêem Morangos Com Açúcar é que, apesar de termos nascido numa época mais amena, fomos atingidos com uma monstruosidade de programas idiotas quando éramos crian­ças. E qual a fase da vida em que mais somos influenciados pela TV? Nem mais!

É incrível como conheço raparigas que admitem com um sorriso na boca que vêem todas as telenovelas de determinado canal ou nacionalidade. Ficar agarrado à TV o dia inteiro faz lembrar um filme de ficção científica: presos a uma cadeira, ador­me­ci­dos, enquanto o nosso cérebro, ligado a máquinas, é repetidamente violado com men­sa­gens e valores que os raptores nos querem fazer passar. Mais tarde, se essas pessoas se libertarem dos fios e saltarem da cadeia, vão lamentar terem-se deixado “seduzir” (será a palavra certa?) por ilusões perversas. Pior que os filhos, são os pais, que no filme es­ta­riam numa sala ao lado a observar a operação por uma janela espelhada, com um sorriso amarelo e um indiferença estúpida, como que a dizer: “Ela pediu-me tanto...”. Que se há-de fazer? A chave está na educação e mentalidade dos pais.

O primeiro assunto foi inspirado no facto de eu recentemente ter comprado a colectânea “Mixtape Files” do DJ Bomberjack e a reedição dos álbuns “Sobre(tudo)” e “Entre(tanto)” do Sam The Kid.

«Putos modernos nem sequer em Pai Natal acreditam»

2caras (GproFam) – “Geração TV” in Poesia Urbana