quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

Egotrip

«Uma das razões principais para muitas pessoas não gostarem de hip hop, é não perceberem porque é que muitos de nós (MC’s) estamos sempre a dizer que somos melhores que os outros, que os outros são piores do que nós, ou que estamos sempre chateados com o mundo. Eu consigo perceber esse julgamento de outsider. É válido. Mas quem respira esta cultura sabe que este comportamento sempre fez e sempre fará parte da nossa música. Há quem lhe chame “Egotrip”.»

Sam The Kid - comentário à música "Ignorância" in Pratica(mente) (2006)

Pois é. Toda a gente conhece. Toda a gente sabe o que é. Mas toda a gente sabe quando o usar? Não me parece. Depois de este excerto que pus aqui, o Sam The Kid fala daquele que se limitam a usar e abusar desta característica dos rappers. Como disse o D-Mars ao Rui Meireles numa entrevista ao H2tuga: «A auto-afirmação também é uma maneira de o MC se exprimir, é apenas isso, por eu dizer que sou o melhor MC do mundo não quer dizer que o seja realmente, mas tenho a necessidade de te dizer isso só para te chocar.» O egotrip deve ser usado, eu acho, mas moderadamente. Muitos não conhecem o significado desta última palavra. O MC não se está a armar quando fala num estilo egocêntrico, nem pode ser considerado como insultos baratos. «Chocar» é a palavra ideal. O MC quer cativar a atenção e fazer tremer o ouvinte, fazê-lo sentir na pele a sua revolta, a fúria derivada da sua relação com o mundo.

Mas o egotrip não é a função principal do MC. A crítica que é feita aqui é directa e dirigida ao ouvinte, enquanto a intervenção que se sobressai no hip hop tem um carácter muito mais abrengente. O egotrip é o rei das battles, logo está conectado ao improviso. Qualquer MC que esteja naqueles dias maus, em que não se consegue concentrar, dá a si mesmo o alívio de descarregar algum raiva da cabeça para o papel. É um instinto. Contudo todos devem ter em mente que egotrip não é inovar, é um desabafo. O egotrip não aborda temas como a pobreza, o racismo ou a hipocrisia (a não ser que seja algo do género «és um falso!»). O egotrip não fala de terceiros, a não ser que directamente relacionados com o ouvinte (“a tua mãe tem vergonha das tuas letras”). O egotrip destina-se apenas exclusivamente a «chocar» e a provocar o ouvinte.

Com isto (e leiam bem antes de criticarem) não pretendo dizer que o egotrip é uma coisa negativa, mas antes que algo de que não devemos abusar nem abdicar e que é um comportamento natural (corrosivo) de um MC para com aqueles que o ouvem. Tem como objectivo fazê-lo sentir inferior, culpado e fascinado com o autor das letras.

«Um grande MC não é aquele que deixa o público saltitante e disperso/ é aquele que deixa o público estupefacto e boquiaberto»

Bónus – “A Diferença” in Bomba Relógio (2002)

quarta-feira, 27 de dezembro de 2006

O D. Sebastião do Rap

Ele chegou! Ajoelhem-se e ouçam o que tem para dizer! Pois é, Sam The Kid está cá mesmo para apresentar o tão esperado álbum “Pratica(mente)”. Qual sonho tornado realidade, apareceu à pouco tempo nas lojas pela primeira vez. Porque, apesar de Samuel Mira ter dito numa entrevista à TSF, há três anos (vejam a entrevista no H2tuga) “eu não quero ser o porta-voz do hip hop” a verdade é que é, como replicou o locutor da rádio, ou pelo um dos. É daquelas ironias da vida, já Albert Einstein, o cérebro da Física, disse uma vez: “Para castigar o meu desprezo pela autoridade, o destino fez de mim uma autoridade”.

Oiçam o “Poetas do Karoeke” e vejam o videoclip no YouTube. Aqui fica o link:

http://www.youtube.com/watch?v=UFCsbzp4LH0

domingo, 24 de dezembro de 2006

Ce réel oder falsh?

Quando ouvimos música portuguesa, todos (como quem diz) sabemos qual a mensagem que o vocalista está a querer transmitir. É a nossa língua materna, vivemos no ambiente ideal (claro!) para perceber qualquer mensagem passada por um português, esteja ela camuflada em metáforas e outras expressões ou não. A probabilidade de essas metáforas e expressões fazerem parte da nossa vida diária é alta, logo não temos qualquer problemas em decompô-la e procurar as palavrinhas certas no nosso vocabulário. Mas alguém de fora pode não conseguir fazê-lo.

Ainda está bem que consigamos compreender também a mensagem do hip hop americano ou inglês, pois, já que a grande maioria do público ligado ao hip hop tem acima de 15 anos, essa(s) língua(s) não nos atrapalha(m). Agora, nem toda a gente sabe falar francês ou alemão, e mesmo a nossa vizinha Espanha tem várias línguas consoante as regiões. Assim, até podemos desenvicilharmo-nos quanto ao castelhano e ao galego, mas não conseguimos traduzir um simples “olá” em basco. Como iremos escolher, de entre o imenso mercado alemão ou francês, aqueles com as quais estamos de acordo, ou aqueles que fazem relatos da sua vida que nos possam interessar. Aliás, porque iremos nós comprar um álbum de alguém que até transmite mensagens com as quais concordamos, se não conseguimos percebê-las. Teremos que aprender todas as línguas relevantes da Europa, ou somos obrigados a cingirmo-nos pelo nosso hip hop “caseiro”?

Este tema surgiu-me depois de comprar o último álbum dos Less du Neuf, “Tant Qu’il En Est Temps”. A dúvida não está em saber se eles acabem um concerto com um público constituído principalmente por crianças a dizer algo como “Bebam, tomem drogas, façam sexo!” (refiro-me ao 50 Cent) ou não, mas antes se poderei escolher eu próprio os grupos que me interessam, sem ter que me guiar por outros ou simplesmente pelo flow. Comentem e esclareçam, obrigado!